quarta-feira, 25 de agosto de 2010

TRISTE FIM DE POLICARPO E NARCIZO

Aracaju, 19 de Agosto de 1986

Meu caro Senador (...omissis...)

É com todo o respeito que dirijo-me ao amigo para, diante das dificuldades do momento, afirmar que lastimavelmente estou chegando a conclusão que o homem não vale somente bem que faz ou pode fazer. Nem mesmo por ser sério e fiel aos amigos. O exemplo de ontem na Assembléia, é prova disso. Lá estão envolvidos um seu compadre, um aliado e um quem o grupo ajudou eleger.
Além da vitória o governador conseguiu injetar no eleitorado uma injeção de esperança de ganhar as eleições através de métodos pouco recomendáveis, mas para muitos válidos. Feio é perder. Argumentam.
Como o Senador tem se demorado pouco em Aracaju, talvez não esteja sabendo de tudo. Existe pressões junto ao Deputado (...omissis...) para que a vaga a ser aberta na chapa do PMDB, por seu intermédio, não lhe pertença. No caso, não seja minha conforme o combinado.
Em isso acontecendo o Senador vai me perdoar. Não posso elogiar e votar em quem me rejeita.
Terei que reunir os amigos, como fiz quando acertamos a minha candidatura, pedir-lhes desculpas, liberá-los, e contar um pouco da minha história política a partir de 1982, quando fui sacrificado a última hora.
O Senador será vítima mesmo antes de eleger o governador. Em quem confiar para o futuro?
Uma outra coisa Senador, fazer o esforço que o senhor está fazendo e incluir meu nome na lista apenas por incluir, não satisfaz. Já disse e repito. Não quero que me vistam de Deputado e me coloquem na Assembléia como se fosse um boneco. Quero sim, condições para disputa.
Existem pessoas para quem o dinheiro é tudo. Não me incluo entre estas graças a Deus. Contudo acho que é chegado o momento de pensar. Pelo menos colocar o meu trabalho, a minha voz e a minha experiência a serviço de quem os valorize. Fazer ou tentar fazer o mal também é uma forma de valorização. Infelizmente.
Depois de anos e anos de elogios e promessas não cumpridas, estou a receber como prêmio o forte “incentivo” da descredibilidade: “ele não tem condições”. “Quem Narcizo não tem condições”. Isso e mais alguma coisa.
Porque a minha falta de condições não foi vista quando o outro lado estava me oferecendo o Céu com todas as Estrelas? Não aceitei para resguardar o sentimento de seriedade e fidelidade. E agora chego a conclusão que valeu muito pouco. Só satisfaz a mim mesmo. Nem mesmo aos filhos e noras. Imagine aos demais.
Diante da incerteza reunir os meus e expliquei o que está acontecendo. Revolta geral. Acomodei-os com um pedido sentimental: não quero revolta nem ressentimentos. Se vocês puderem me fazer um favor, mesmo depois de minha morte, enquanto existir um (...omissis...) candidato votem e onde eu estiver serei grato a vocês.
A resposta foi positiva, mas acompanhada de lágrimas, o que já é muito para minha idade. Entre os exemplos contei para eles os lances de minha ida para a Secretaria extraordinária, os motivos pelos quais fui afastado da última vez e a conversa com o (...omissis...) depois de tudo, ou mais precisamente no dia em que ele, aniversariando, cumprimentei-o pelo telefone.

- Deputado, parabéns pelo aniversário.
- Muito obrigado, fiquei feliz você ter telefonado. Não quero lhe perder.
- Tudo bem.
- Conversaremos em Aracaju.

Uma tarde, na Vila Cristina, ao ser recebido com um aperto de mão, travamos a seguinte conversa.

- É bem que dava pra você.
- É tarde doutor, não adianta mais.
- Adianta porque eu fico lhe devendo uma reparação. Quis que o (...omissis...) me desse uma Secretaria para você, ele não me atendeu.
- Não doutor, fico como assessor.
- Mas não se preocupe, na próxima o compromisso é meu. Tem muita gente aí que só pensa no poder depois que chega lá esquece.
- Disso o senhor já sabe a muito tempo.

Passaram-se os dias e no apartamento da Barão de Maruim, a noite, não recebi um convite, mas a comunicação de que seria indicado para a Secretaria de Educação. Falamos dos planos políticos e ouvi as queixas de (...omissis...). E finalmente a promessa. Na próxima é você. Estou cansado de ajudar a quem não presta.
No dia em que (...omissis...) mandou me convidar para conversar. Procurei o (...omissis...) – o Senador não estava em Sergipe – e disse-lhe do convite. A resposta foi, vá. Você não vai se comprometer vai ouvi-lo.
Fui ouvi, ri, tomei cafezinho e sair. Volto depois, e não voltei mais.
Desculpe-me Senador, ter que fazer esse relato. Mas ele foi e é necessário neste momento para os meus filhos, que respeito as amizades acima de tudo.
Contudo, depois de explicar a eles o seu sofrimento, que bem os conheço, na medida que me é confiado, tenho um pedido a fazer: por favor não me convide a ficar com quem me rejeita ou me unir com quem em mim não acredita. Sou humano como qualquer outro, não sou gênio.
Não estou zangado. Estou sentido. Reflita e qualquer que seja a sua decisão esteja certo que é para sempre o penhor de minha gratidão ao amigo.


Narcizo Machado
* Esta carta escrita pelo meu tio Narcizo Machado me foi cedida pelos meus primos Narcizo Machado Filho e Naercio Machado.